O cepticismo, no tocante à Doutrina Espírita, quando
não resulta de uma oposição sistemática por interesse,
origina-se quase sempre do conhecimento incompleto dos
fatos, o que não obsta a que alguns cortem a questão como
se a conhecessem a fundo. Pode-se ter muito atilamento,
muita instrução mesmo, e carecer-se de bom-senso. Ora, o
primeiro indício da falta de bom-senso está em crer alguém
infalível o seu juízo. Muita gente também há para quem as
manifestações espíritas nada mais são do que objeto de
curiosidade. Confiamos em que, lendo este livro, encontrarão nesses extraordinários fenômenos alguma coisa mais
do que simples passatempo.
A ciência espírita compreende duas partes: experimental uma, relativa às manifestações em geral; filosófica, outra, relativa às manifestações inteligentes. Aquele que apenas haja observado a primeira se acha na posição de quem
não conhecesse a Física senão por experiências recreativas, sem haver penetrado no âmago da ciência. A verdadeira Doutrina Espírita está no ensino que os Espíritos deram, e os conhecimentos que esse ensino comporta são por
demais profundos e extensos para serem adquiridos de
qualquer modo, que não por um estudo perseverante, feito
no silêncio e no recolhimento. Porque, só dentro desta condição se pode observar um número infinito de fatos e particularidades que passam despercebidos ao observador superficial, e firmar opinião. Não produzisse este livro outro
resultado além do de mostrar o lado sério da questão e de
provocar estudos neste sentido e rejubilaríamos por haver
sido eleito para executar uma obra em que, aliás, nenhum mérito pessoal pretendemos ter, pois que os princípios nela
exarados não são de criação nossa. O mérito que apresenta
cabe todo aos Espíritos que a ditaram. Esperamos que dará
outro resultado, o de guiar os homens que desejem esclarecer-se, mostrando-lhes, nestes estudos, um fim grande e
sublime: o do progresso individual e social e o de lhes
indicar o caminho que conduz a esse fim.
Concluamos, fazendo uma última consideração. Alguns
astrônomos, sondando o espaço, encontraram, na distribuição dos corpos celestes, lacunas não justificadas e em
desacordo com as leis do conjunto. Suspeitaram que essas
lacunas deviam estar preenchidas por globos que lhes tinham escapado à observação. De outro lado, observaram
certos efeitos, cuja causa lhes era desconhecida e disseram: Deve haver ali um mundo, porquanto esta lacuna não
pode existir e estes efeitos hão de ter uma causa. Julgando
então da causa pelo efeito, conseguiram calcular-lhe os elementos e mais tarde os fatos lhes vieram confirmar as previsões. Apliquemos este raciocínio a outra ordem de idéias.
Se se observa a série dos seres, descobre-se que eles formam uma cadeia sem solução de continuidade, desde a
matéria bruta até o homem mais inteligente. Porém, entre
o homem e Deus, alfa e ômega de todas as coisas, que imensa lacuna! Será racional pensar-se que no homem terminam os anéis dessa cadeia e que ele transponha sem transição a distância que o separa do infinito? A razão nos diz
que entre o homem e Deus outros elos necessariamente
haverá, como disse aos astrônomos que, entre os mundos
conhecidos, outros haveria, desconhecidos. Que filosofia já
preencheu essa lacuna? O Espiritismo no-la mostra preenchida pelos seres de todas as ordens do mundo invisível e estes seres não são mais do que os Espíritos dos homens,
nos diferentes graus que levam à perfeição. Tudo então se
liga, tudo se encadeia, desde o alfa até o ômega. Vós, que
negais a existência dos Espíritos, preenchei o vácuo
que eles ocupam. E vós, que rides deles, ousai rir das obras
de Deus e da sua onipotência!
ALLAN KARDEC.
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